A Prefeitura de Maricá, por meio da Secretaria de Cultura e Utopias, encerrou neste domingo (29/06) o II Festival de Cinema e Política em grande estilo, com uma programação marcada pela emoção, memória e compromisso com a democracia. A mesa “Cinema, Política e Contemporaneidade”, realizada no final da tarde e início da noite, reuniu nomes de peso para um debate profundo sobre os caminhos da arte, da cultura e da história brasileira.
Participaram do encontro a jornalista e ativista Hildegard Angel, o cineasta Sérgio Rezende, o historiador e professor Francisco Carlos Teixeira e o secretário de Cultura e das Utopias de Maricá, Sady Bianchin, que foi o mediador da conversa. O auditório, mais uma vez teve a presença de um bom público, confirmando o sucesso que marcou toda a programação do festival.
Quem abriu a roda de conversa foi o historiador Francisco Carlos Teixeira, trazendo uma reflexão sobre o papel do samba como forma de resistência e liberdade. “O samba foi uma das primeiras formas de insurgência cultural do povo brasileiro. Ele nasce da dor, da marginalização, mas também da esperança. Quando os poderosos proibiam, o povo sambava. Era uma maneira de afirmar sua identidade, sua liberdade e seu pertencimento. O samba é política, é história, é luta”, afirmou.
O secretário Sady Bianchin deu sequência ao bate-papo, destacando a importância da educação e da cultura como ferramentas concretas de transformação social. Ele lembrou com carinho de sua formação acadêmica com Francisco Carlos e citou com orgulho os investimentos da Prefeitura de Maricá. “Aqui, não falamos de cultura apenas como entretenimento. Falamos de cultura como política pública, como direito. O Passaporte Universitário, por exemplo, já permitiu que milhares de jovens de Maricá tenham acesso ao ensino superior. Isso muda vidas. Isso constrói um novo futuro”, declarou.
Em seguida, Hildegard Angel emocionou a plateia ao relembrar a trajetória de sua mãe, a estilista Zuzu Angel, e do seu irmão, Stuart Angel, militante político assassinado pela ditadura militar em 1971. “Meu irmão foi preso, torturado e morto. Minha mãe, Zuzu, nunca se calou. Denunciou o regime em fóruns internacionais, escreveu cartas, usou a moda como arma. Seus desfiles se tornaram gritos silenciosos de dor e de denúncia. Ela transformou a dor em força, a moda em protesto. Infelizmente, minha mãe também foi vítima desse regime: Zuzu Angel sofreu um assassinato cruel em 1976, em circunstâncias que ainda hoje geram questionamentos, mas que para nós são um símbolo do quanto o Estado tentou calar aqueles que ousaram lutar pela verdade e pela justiça”, relatou Hildegard.
Hildegard fez ainda uma análise contundente sobre o cenário político contemporâneo. “Um país sem suas heroínas e sem seus mártires não tem cultura, não tem história. O conceito de patriotismo foi sequestrado — primeiro pelos militares, depois por aqueles que vestem camisa amarela e pediram a volta da ditadura. Mas precisamos resistir. Podemos reagir ao opressor. E devemos”, completou.
Fechando a mesa, o cineasta Sérgio Rezende compartilhou os bastidores da produção do filme Zuzu Angel (2006), exibido logo após o debate. “Eu sempre fui ligado às figuras da nossa história. O público brasileiro quer — e precisa — ouvir as nossas histórias. Existe um espaço gigantesco para contar o Brasil. E Zuzu é uma dessas personagens que não podem ser esquecidas. Sua luta é universal, é pela memória, pela dignidade e pela verdade”, disse.
Rezende também destacou a importância de eventos como o II Festival de Cinema e Política. “Aqui, a arte encontra a política no melhor sentido da palavra: como construção coletiva, como instrumento de transformação. E é bonito ver uma cidade como Maricá investir nisso, com coragem e visão”, concluiu.
A sessão de cinema, que encerrou a noite, reuniu dezenas de pessoas em uma atmosfera de respeito e comoção. O filme Zuzu Angel, estrelado por Patrícia Pillar, narra a luta da estilista contra os abusos do regime militar e o silenciamento imposto aos que ousavam questionar o poder.
Realizado pela Prefeitura de Maricá, por meio da Secretaria de Cultura e das Utopias, através do CECIP, o II Festival de Cinema e Política consolidou-se como um espaço de debate crítico e de valorização da memória nacional. Durante vários dias, nomes como Frei Betto, Daniel Filho, Cid Benjamin, Susanna Lira e tantos outros passaram pelo evento, reforçando o compromisso do município com a cultura, a democracia e os direitos humanos. Com entrada gratuita, participação popular intensa e temas atuais e históricos, o festival termina deixando um convite à reflexão: em tempos de negação da história, a arte segue sendo um ato de resistência.